quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

AINDA A MÍSTICA FEMININA

Inicio esse blogue fazendo uma homenagem póstuma a Betty Friedan, escritora norte-americana, feminista, que faleceu no dia 04 de fevereiro de 2006, portanto há quase três anos. Felizmente a morte não leva junto o pensamento e isso faz com que algumas pessoas entendam que o real sentido de imortalidade consiste nas idéias que são deixadas para a posteridade: o nosso legado. Em se tratando de Friedan, o seu maior legado foi nos ter deixado um precioso livro intitulado A Mística Feminina. Apesar de analisar as mulheres casadas da classe média norte-americana, podemos perceber o quanto o livro é atual e o quanto alguns mitologemas de gênero perduram na sociedade em que vivemos, para o infortúnio de mulheres e homens, portanto da humanidade.

Betty Friedan ao identificar os problemas das mulheres daquela geração e classe social chamou-os, de início, de "sem nome" porque não havia um nome para o que as mulheres sentiam e as levavam aos consultórios psicanalíticos. Um dos espaços questionados por Friedan era a mídia. Além dos depoimentos das mulheres, com a devida análise, Friedan questionou o papel da mídia na construção dos mitos de feminilidade - senha de acesso e de derrota para a mulher. De acesso porque sem eles as mulheres eram excluídas, não eram vistas como mulheres, de derrota porque ao aceitá-los, estava destinando para si mesma os limites impostos ao sexo.

As peças publicitárias e as revistas, sobretudo, eram vistas como veículo ideológico que reproduziam um modelo de comportamento feminino a ser aceito consensualmente. Essa discussão também está presente nas reflexões de uma outra escritora norte-americana que analisa a mídia interseccionando com as questões de gênero e mulher - Susan Faludi. Em seu livro intitulado Backlash, publicado nos Estados Unidos nos anos 80, e no Brasil dez anos depois, Faludi, afirma que as mulheres nunca alcançaram a conquista plena, como é alardeado pela mídia. Segundo ela, as mulheres teriam chegado perto, mas não o suficiente para desmontar a estrutura burguesa que tentou sedimentar as desigualdades das relações de gênero, há anos denunciadas pelas feministas de várias gerações e países. Faludi amplia a leitura midiática sobre a mulher, evidenciando um momento de reação nos anos 80, acrescentando leituras sobre filmes.

Betty Friedan, antes de Faludi, havia exposto que as mulheres da sua geração, a de 60, estavam confinadas ao lar, reduzindo seu potencial humano às tarefas da casa: cuidar do marido e dos filhos. A existência da mulher consistia em viver para o outro, definindo a sua identidade a partir dos papéis sociais de mãe e esposa, já que enquanto indivíduo-mulher, ela não existia para a sociedade. Faludi, vinte anos depois, mostra pontos de conexões entre os anos 50 e 80, mostrando que nos anos 80 houve uma reação contra a mulher da qual fez/faz parte a mídia.

"O estranho é que, à medida que a mística feminina se divulgava, negando à mulher profissões ou quaisquer compromissos fora do lar, triplicava o número de mulheres trabalhando em diferentes empregos. E' verdade que duas em três continuavam a ser donas de casa. Mas por que, no momento em que as portas do mundo se abriam finalmente para todas as mulheres, a mística negaria os sonhos femininos de um século?" (Friedan)